segunda-feira, 13 de abril de 2020

Dom Schneider fala sobre a conduta da Igreja em face do coronavírus.


À medida que o coronavírus continua a se espalhar, Dom Athanasius Schneider exorta os padres a imitar Jesus, o Bom Pastor, e, pelo bem das almas, até a desobedecer às ordens injustas dos bispos que, segundo ele, agora estão se comportando mais como “burocratas civis” do que como “pastores”.

 Diane Montagna: Excelência, qual é a sua impressão geral sobre o modo como a Igreja está lidando com a epidemia do coronavírus?

Dom Schneider: Minha impressão geral é de que a maioria predominante dos bispos reagiu precipitadamente e em pânico ao proibir todas as missas públicas e o que é ainda mais incompreensível – ao fechar as igrejas. Tais bispos reagiram mais como burocratas civis do que pastores. Ao se concentrarem exclusivamente em todas as medidas de proteção higiênicas, eles perderam uma visão sobrenatural e abandonaram a primazia do bem eterno das almas.

A Diocese de Roma suspendeu rapidamente todas as missas públicas para cumprir as diretrizes do governo. Os bispos de todo o mundo adotaram medidas semelhantes. Os bispos poloneses, por outro lado, pediram que mais missas fossem celebradas, a fim de que a concentração de fiéis fosse menor. Qual a sua opinião sobre a decisão de suspender as missas públicas para impedir a disseminação do coronavírus?

Enquanto os supermercados estiverem abertos e acessíveis e as pessoas tiverem acesso ao transporte público, não se vê uma razão plausível para proibir as pessoas de assistir à Santa Missa em uma igreja. Podem-se garantir nas igrejas as mesmas e ainda melhores medidas de proteção higiênica. Por exemplo, antes de cada missa, seria possível desinfetar os bancos e as portas, e todo mundo que entrasse na igreja poderia desinfetar as mãos. Outras medidas semelhantes também poderiam ser tomadas. Pode-se limitar o número de participantes e aumentar a frequência da celebração da missa. Temos um exemplo inspirador de visão sobrenatural em tempos de epidemia no Presidente da Tanzânia, John Magufuli. Católico praticante, no domingo 22 de março de 2020 (domingo de Laetare), na Catedral de São Paulo, na capital tanzaniana de Dodoma, ele declarou: “Insisto com vocês, meus irmãos cristãos e até muçulmanos: não tenham medo, não parem de se reunir para glorificar a Deus e louvá-Lo. Por isso, como governo, não fechamos igrejas ou mesquitas. Em vez disso, elas devem estar sempre abertas para o povo buscar refúgio em Deus. As igrejas são lugares onde as pessoas podem buscar a verdadeira cura, porque ali reside o Deus verdadeiro. Não tenham medo de louvar e buscar o rosto de Deus na igreja”.
Referindo-se à Sagrada Eucaristia, o presidente Magufuli também falou estas palavras encorajadoras: “O coronavírus não pode sobreviver no Corpo eucarístico de Cristo; em breve será queimado. Foi exatamente por isso que não entrei em pânico ao receber a Sagrada Comunhão, porque sabia que com Jesus na Eucaristia eu estou seguro. Este é o momento de construirmos nossa fé em Deus”.

Vossa Excelência julga ser atitude responsável um sacerdote celebrar uma missa particular com alguns fiéis leigos presentes, tomando as devidas precauções de saúde?

É responsável, e também meritório, e seria um autêntico ato pastoral, desde que o sacerdote tome as precauções de saúde necessárias.

Os padres estão em uma posição difícil nessa situação. Alguns bons padres estão sendo criticados por obedecerem às diretrizes de seu bispo para suspender as missas públicas (enquanto continuam a celebrar uma missa particular). Outros estão procurando maneiras criativas de ouvir confissões enquanto procuram proteger a saúde das pessoas. Que conselho V. Exa. daria aos padres para viverem sua vocação nesses tempos?

Os padres devem se recordar que são antes e acima de tudo pastores de almas imortais. Eles devem imitar a Cristo, que disse: “Eu sou o bom-pastor. O bom-pastor expõe a sua vida pelas ovelhas. O mercenário, porém, que não é pastor, a quem as ovelhas não pertencem, quando vê que o lobo vem vindo, abandona as ovelhas e foge; o lobo rouba e dispersa as ovelhas. O mercenário, porém, foge, porque é mercenário e não se importa com as ovelhas. Eu sou o bom-pastor. Conheço as minhas ovelhas e as minhas ovelhas conhecem a mim” (Jo 10, 11-14). Se um sacerdote toma de maneira razoável todas as precauções de saúde necessárias e usa discrição, ele não deve obedecer às diretrizes de seu bispo ou do governo para suspender a missa pelos fiéis. Tais diretrizes constituem uma mera lei humana; no entanto, a lei suprema da Igreja é a salvação das almas. Os padres em tal situação precisam ser extremamente criativos para prover aos fiéis, mesmo para um pequeno grupo, a celebração da Santa Missa e a recepção dos sacramentos. Tal era o comportamento pastoral de todos os sacerdotes que foram confessores e mártires por ocasião das perseguições.

O desafio à autoridade, particularmente à autoridade eclesial, pelos padres é sempre legítimo (por exemplo, se um padre for instruído a não visitar os doentes e moribundos)?

Se um sacerdote for proibido por uma autoridade eclesiástica de visitar os doentes e moribundos, ele não pode obedecer. Essa proibição é um abuso de poder. Cristo não deu ao bispo o poder de proibir a visita aos doentes e moribundos. Um verdadeiro padre fará todo o possível para visitar uma pessoa que está morrendo. Muitos padres o fizeram mesmo quando isso significava colocar suas vidas em perigo, seja no caso de perseguição ou no caso de epidemia. Temos muitos exemplos desses padres na história da Igreja. São Carlos Borromeo, por exemplo, dava a Sagrada Comunhão com as próprias mãos na língua dos moribundos infectados pela praga. Em nossos dias, temos o exemplo emocionante e edificante de padres, especialmente da região de Bérgamo, no norte da Itália, que foram infectados e morreram porque cuidavam de pacientes com coronavírus que estavam morrendo. Um padre de 72 anos com coronavírus morreu há alguns dias na Itália após desistir do ventilador, do qual precisava para sobreviver, permitindo que o mesmo fosse disponibilizado a um paciente mais jovem. Não visitar os doentes e moribundos é comportamento mais de um mercenário do que de um bom pastor.

Seus primeiros anos foram gastos na igreja subterrânea soviética. Que luzes ou perspectivas Vossa Excelência gostaria de compartilhar com os fiéis leigos que não podem assistir à missa e, em alguns casos, nem sequer podem passar um tempo antes do abençoado Sacramento, porque todas as igrejas em sua diocese foram fechadas?

Eu encorajaria os fiéis a fazerem frequentes atos de comunhão espiritual. Eles poderiam ler e meditar as leituras diárias e todo o ordinário da Missa. Eles poderiam enviar seu santo Anjo da Guarda para adorar Jesus Cristo no tabernáculo em seu nome. Eles poderiam se unir espiritualmente com todos os cristãos que estão na prisão por causa de sua fé, com todos os cristãos que estão doentes e acamados, com todos os cristãos moribundos que estão privados dos sacramentos. Deus preencherá este tempo de privação temporal da Santa Missa e do Santíssimo Sacramento com muitas graças.

O Vaticano anunciou recentemente que as liturgias da Páscoa serão celebradas sem os fiéis presentes. Mais tarde, especificou que está estudando “formas de implementação e participação que respeitem as medidas de segurança adotadas para impedir a disseminação do coronavírus”. Qual é a sua opinião sobre essa decisão?

Dada a estrita proibição de reuniões em grupo pelas autoridades governamentais italianas, pode-se entender que o Papa não possa celebrar as liturgias da Semana Santa com a presença de um grande número de fiéis. Penso que as liturgias da Semana Santa poderiam ser celebradas pelo Papa com toda a dignidade e sem simplificações, por exemplo, na Capela Sistina – como era costume dos papas antes do Concílio Vaticano II –, com a participação do clero (cardeais, padres) e de um grupo selecionado de fiéis, aos quais s seriam aplicadas previamente medidas de proteção higiênica. Não se vê a lógica em proibir o acendimento do fogo, a bênção da água e o batismo na Vigília Pascal, como se essas ações litúrgicas disseminassem um vírus. Um medo quase patológico superou o bom senso e a visão sobrenatural.

Excelência, o que o manejo da epidemia do coronavírus pela Igreja revela do estado da Igreja e particularmente da hierarquia?

Está revelando a perda da visão sobrenatural. Nas últimas décadas, muitos membros da hierarquia da Igreja se imergiram predominantemente em assuntos seculares, mundanos e temporais e, portanto, ficaram cegos para as realidades sobrenaturais e eternas. Seus olhos foram preenchidos com o pó das ocupações terrenas, como disse São Gregório Magno (ver Regula pastoralis II, 7). A reação deles ao lidar com a epidemia do coronavírus revelou que dão mais importância ao corpo mortal do que à alma imortal dos homens, esquecendo as palavras de nosso Senhor: “Do que adianta ao homem ganhar o mundo inteiro se ele vier a perder sua alma? ”(Marcos 8:36). Os mesmos bispos que agora tentam proteger às vezes com medidas desproporcionais os corpos de seus fiéis da contaminação por um vírus material, permitiram tranquilamente que o vírus venenoso dos ensinamentos e práticas heréticos se espalhasse entre seus rebanhos.

O cardeal Vincent Nichols disse recentemente que teremos uma nova fome pela Eucaristia após o término da epidemia do coronavírus. Vossa Excelência concorda? 

Espero que essas palavras venham a ser verdadeiras para muitos católicos. É uma experiência humana comum que a privação prolongada de uma realidade importante inflama os corações das pessoas com um desejo por ela. Isso se aplica, é claro, àqueles que realmente acreditam e amam a Eucaristia. Essa experiência também ajuda a refletir mais profundamente sobre o significado e o valor da Sagrada Eucaristia. Talvez aqueles católicos que estavam tão acostumados com o Santo dos Santos a ponto de considerá-Lo algo comum tenham uma conversão espiritual e passem a compreender e tratar a Sagrada Eucaristia como extraordinária e sublime.

No domingo, 15 de março, o Papa Francisco foi rezar diante da imagem do Salus Populo Romani em Santa Maria Maggiore e diante do milagroso crucifixo instalado na igreja de San Marcelo al Corso. Vossa Excelência julga importante que bispos e cardeais realizem atos semelhantes de oração pública pelo fim do coronavírus?

O exemplo do Papa Francisco pode encorajar muitos bispos a atos semelhantes de testemunho público de fé e oração e a sinais concretos de penitência implorando a Deus para que acabe com a epidemia. Pode-se recomendar aos bispos e padres a percorrerem regularmente suas cidades, vilas e aldeias com o Santíssimo Sacramento no ostensório acompanhado por um pequeno número de clérigos ou fiéis um, dois, ou três, dependendo dos regulamentos do governo. Tais procissões com Jesus Eucarístico transmitirão aos fiéis e aos cidadãos o consolo e a alegria de não estarem sozinhos em tempos de tribulação, de que o Senhor está verdadeiramente com eles, de que a Igreja é uma Mãe que não esqueceu nem abandonou seus filhos. Poder-se-ia lançar pelas ruas deste mundo uma cadeia mundial de ostensórios com Jesus Eucarístico. Tais pequenas procissões eucarísticas, mesmo que realizadas apenas por um bispo ou sacerdote, implorariam graças de cura e conversão física e espiritual.

O coronavírus eclodiu na China pouco depois do Sínodo da Amazônia. Alguns meios de comunicação acreditam firmemente que essa é uma retribuição divina pelos eventos de Pachamama no Vaticano? Outros acreditam tratar-se de um castigo divino para o acordo Vaticano-China? Vossa Excelência julga válida alguma dessas posições?

A epidemia de coronavírus, em minha opinião, é sem dúvida uma intervenção divina para castigar e purificar o mundo pecaminoso e também a Igreja. Não devemos esquecer que Nosso Senhor Jesus Cristo considerou as catástrofes físicas como castigos divinos. Lemos, por exemplo: “Neste mesmo tempo, alguns contavam o que tinha acontecido a certos galileus, cujo sangue Pilatos misturara com os seus sacrifícios. Jesus toma a palavra e lhes pergunta: ‘Pensais vós que esses galileus foram maiores pecadores do que todos os outros galileus, por terem sido tratados desse modo? Não, digo-vos. Mas se não vos arrependerdes, perecereis todos do mesmo modo. Ou cuidais que aqueles dezoito homens, sobre os quais caiu a torre de Siloé e os matou, foram mais culpados do que todos os demais habitantes de Jerusalém? Não, digo-vos. Mas se não vos arrependerdes, perecereis todos do mesmo modo” (Lc 13, 1-5).
A adoração ritual ao ídolo pagão da Pachamama dentro do Vaticano com a aprovação do Papa foi certamente um grande pecado de infidelidade ao Primeiro Mandamento do Decálogo, foi uma abominação. Toda tentativa de minimizar esse ato de veneração não conseguiu resistir à enxurrada de evidências e razões óbvias. Penso que esses atos de idolatria foram o culminar de uma série de outros atos de infidelidade à salvaguarda do depósito divino da fé por muitos membros do alto escalão da hierarquia da Igreja nas últimas décadas. Não tenho certeza absoluta de que o surto de coronavírus seja um castigo divino pelos eventos de Pachamama no Vaticano, mas considerar tal possibilidade não seria exagero. Já no começo da Igreja, Cristo repreendeu os bispos (“anjos”) das igrejas de Pérgamo e Tiatira por causa de sua conivência com a idolatria e o adultério. A figura de “Jezabel”, que seduziu a igreja de Tiatira à idolatria e ao adultério (ver Ap 2:20), também pode ser entendida como um símbolo do mundo atual, com o qual muitos com cargo de responsabilidade na Igreja estão hoje flertando.
As seguintes palavras de Cristo também permanecem válidas para o nosso tempo: “Desta vez a lançarei num leito, e com ela os cúmplices de seus adultérios para aí sofrerem muito, se não se arrependerem das suas obras. Farei perecer pela peste os seus filhos, e todas as igrejas hão de saber que Eu sou aquele que sonda os rins e os corações, porque darei a cada um de vós segundo as vossas obras” (Ap 2, 22-23). Cristo ameaçou com o castigo e chamou as igrejas à penitência: “Tenho alguma coisa contra ti: é que tens aí sequazes da doutrina [de que é lícito] comer carne imolada aos ídolos e praticar a fornicação. (…) Arrepende-te, pois; senão virei em breve a ti e combaterei contra eles com a espada da minha boca” (Ap 2, 14 e 16). Estou convencido de que Cristo repetiria as mesmas palavras ao Papa Francisco e aos outros bispos que consentiram na veneração idólatra da Pachamama e aprovaram implicitamente relações sexuais fora de um casamento válido, permitindo que os chamados “divorciados em segunda união” sexualmente ativos possam receber a Sagrada Comunhão.

Vossa Excelência apontou para os evangelhos e o livro do Apocalipse. A maneira de Deus lidar com o povo eleito no Antigo Testamento nos dá alguma ideia da situação atual?

A epidemia do coronavírus causou dentro da Igreja uma situação que, ao meu conhecimento, é única, ou seja, uma proibição quase mundial de todas as missas públicas. Isso é parcialmente análogo à proibição do culto cristão em quase todo o Império Romano nos três primeiros séculos. A situação atual é sem precedentes. No entanto, por que no nosso caso a proibição do culto público foi emitida pelos bispos católicos antes mesmo dos mandatos governamentais respectivos?
De alguma forma, a situação atual também pode ser comparada à cessação do culto sacrificial do Templo de Jerusalém, durante o cativeiro babilônico do Povo Eleito. Na Bíblia, o castigo divino era considerado uma graça, por exemplo. “Bem-aventurado o homem a quem Deus corrige! Não desprezes a lição do Todo-poderoso. Pois ele fere e cuida; se golpeia, sua mão cura” (Jó 5, 17-18), e “Eu repreendo e castigo aqueles que amo. Reanima, pois, o teu zelo e arrepende-te” (Ap 3, 19). A única reação adequada às tribulações, catástrofes e epidemias e situações semelhantes – que são instrumentos da mão da Divina Providência para despertar as pessoas do sono do pecado e da indiferença aos mandamentos de Deus e à vida eterna – é a penitência e a conversão sincera a Deus. Na oração a seguir, o profeta Daniel dá aos fiéis de todos os tempos um exemplo da verdadeira mentalidade que eles devem ter e de como devem se comportar e orar em tempos de tribulação: “Todo o Israel transgrediu vossa Lei e se desviou, a fim de não obedecer à vossa voz” (…) Ó meu Deus, ficai atento para ouvir-nos; abri os olhos para ver nossa ruína e a cidade que ostenta um nome vindo de vós. Não é em nome dos nossos atos de justiça que depositamos a vossos pés nossas súplicas, mas em nome de vossa grande misericórdia. Senhor, escutai! Senhor, perdoai! Senhor, ficai atento! Agi! Por vosso próprio amor, ó meu Deus, não demoreis, pois vosso nome foi dado à vossa cidade e a vosso povo!”(Dan 9, 11,18-19).

São Roberto Belarmino escreveu: “Sinais seguros da vinda do Anticristo [serão] a maior e última perseguição, e também a completa interrupção do sacrifício público (da Missa)” (A Profecia de Daniel, páginas 37-38). ) Vossa Excelência acha que o que ele se refere aqui ao que estamos testemunhando agora? É o começo do grande castigo profetizado no Livro do Apocalipse?

A situação atual fornece motivos suficientemente razoáveis ​​para se pensar que estamos no início de um tempo apocalíptico, que inclui castigos divinos. Nosso Senhor se referiu à profecia de Daniel: “Quando virdes estabelecida no lugar santo a abominação da desolação que foi predita pelo profeta Daniel  – o leitor entenda bem” (Mt 24, 15). O Livro do Apocalipse diz que a Igreja deverá fugir por um tempo para o deserto (ver Ap 12,14). A atual cessação quase geral da celebração pública da Missa poderia ser interpretada como uma fuga para um deserto espiritual. O que é lamentável em nossa situação é o fato de muitos membros da hierarquia da Igreja não verem a situação atual como uma tribulação, como um castigo divino, ou seja, como uma “visita divina” no sentido bíblico. Estas palavras do Senhor também se aplicam a muitos clérigos no meio da atual epidemia física e espiritual: “No conheceste o tempo em que foste visitada” (Lc 19, 44). A situação atual desse “fogo da provação” (ver 1 Pd 4, 12) deve ser tomada a sério pelo Papa e pelos bispos, a fim de levar a uma profunda conversão de toda a Igreja. Se isso não ocorrer, aplicar-se-á também à nossa situação atual a seguinte mensagem de Soren Kierkegaard: “Um incêndio eclodiu nos bastidores de um teatro. O palhaço saiu para avisar o público, que pensou que era uma piada e aplaudiu. Ele repetiu, mas a aclamação foi ainda maior. Eu acho que é assim que o mundo chegará ao fim: no meio dos aplausos gerais dos espertalhões que acreditarem tratar-se de uma piada”.

Excelência, qual é o significado mais profundo por trás de tudo isso?

A situação da cessação pública da Santa Missa e da Sagrada Comunhão sacramental é tão única e séria que se pode descobrir por trás de tudo isso um significado mais profundo. Isso ocorreu quase cinquenta anos após a introdução da Comunhão na mão (em 1969) e uma reforma radical no rito da Missa (em 1969/1970) com seus elementos protestantes (orações do ofertório) e seu estilo de celebração horizontal e instrutiva (momentos de estilo livre, celebração em círculo fechado e em direção ao povo). A práxis da Comunhão na mão durante os cinquenta anos levou rapidamente a uma profanação intencional e não intencional do Corpo Eucarístico de Cristo em uma escala sem precedentes. Por mais de cinquenta anos, o Corpo de Cristo foi (principalmente sem querer) pisoteado pelo clero e os leigos nas igrejas católicas em todo o mundo. O roubo de hóstias consagradas também tem aumentado a um ritmo alarmante. A prática de receber a Sagrada Comunhão diretamente com as próprias mãos e os dedos se assemelha cada vez mais ao gesto de comer comida comum. Em não poucos católicos a prática de receber a Comunhão na mão enfraqueceu a fé na Presença Real, na transubstanciação e no caráter divino e sublime da Sagrada Hóstia. Com o tempo, a presença eucarística de Cristo tornou-se inconscientemente para esses fiéis uma espécie de pão ou símbolo sagrado. Agora, o Senhor interveio e privou quase todos os fiéis de assistir à Santa Missa e de receber sacramentalmente a Sagrada Comunhão.
Os inocentes e os culpados estão suportando esta tribulação juntos, pois no mistério da Igreja todos estão mutuamente unidos como membros: “Se um membro sofre, todos os membros padecem com ele” (1 Cor 12, 26). A atual cessação da Santa Missa e da Comunhão públicas poderia ser entendida pelo Papa e pelos bispos como uma repreensão divina pelos últimos cinquenta anos de profanações e banalizações eucarísticas e, ao mesmo tempo, como um apelo misericordioso para uma autêntica conversão eucarística da Igreja. Da Igreja inteira. Que o Espírito Santo toque o coração do Papa e dos bispos e leve-os a emitir normas litúrgicas concretas, a fim de que o culto eucarístico de toda a Igreja seja purificado e orientado novamente para o Senhor [ou seja, celebrando ad orientem e não versus populum].
Pode-se sugerir ao Papa que realize juntamente com cardeais e bispos um ato público de reparação em Roma pelos pecados contra a Sagrada Eucaristia, bem como pelo pecado dos atos de culto religioso às estátuas da Pachamama. Uma vez terminada a atual tribulação, o Papa deveria emitir normas litúrgicas concretas, nas quais convidasse toda a Igreja a se voltar novamente para o Senhor na forma de celebração, ou seja, com o celebrante e os fiéis voltados para a mesma direção durante a oração eucarística. O Papa também deveria proibir a prática da Comunhão na mão, pois a Igreja não pode continuar tratando impunemente, de maneira tão minimalista e insegura, o Santo dos Santos na pequena Hóstia consagrada.
A seguinte oração de Azarias na fornalha ardente, que todo sacerdote diz durante o ritual do ofertório da Missa, poderia inspirar o Papa e os bispos a ações concretas de reparação e restauração da glória do sacrifício eucarístico e do Corpo Eucarístico do Senhor: “Que a contrição de nosso coração e a humilhação de nosso espírito nos permita achar bom acolhimento junto a Vós, Senhor, como se nós nos apresentássemos com um holocausto de carneiros, de touros e milhares de gordos cordeiros! Que assim possa ser hoje o nosso sacrifício em vossa presença! Que possa reconciliar-nos convosco, porque nenhuma confusão existe para aqueles que põem em Vós sua confiança. É de todo nosso coração que agora Vos seguimos, Vos reverenciamos, buscamos a vossa face. Não nos confundais; tratai-nos com vossa habitual doçura e com todas as riquezas de vossa misericórdia. Ponde vossos prodígios em execução para nos salvar, Senhor, e cobri vosso nome de glória” (Dan 3: 39-43).

Diane Montagna



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