sábado, 21 de novembro de 2020

Diferenças entre devoção popular e abusos litúrgicos

 

Em tempos de internet, se percebe uma coisa muito séria no meio católico, que é a acusação de “profanação”, “abuso litúrgico” e coisas parecidas, para qualquer ato diferente que aconteça na Igreja. Para muitos que se tornaram católicos há pouco tempo, qualquer gesto fora do ritual litúrgico comum torna-se uma grave ofensa a Deus. Vamos pisar um pouco no freio, para observarmos com atenção o que se passa do outro lado da estrada.

Sabemos que a fé cristã chegou em nossa terra no ano de 1500. Os missionários passavam pelas aldeias, pregavam o Evangelho, mas não permaneciam. Então, aquele povo que não tinha assistência eclesiástica de forma regular começava a louvar a Deus com uma liturgia própria. Surge então o que chamamos de “religiosidade popular”, ou seja, aquilo que o povo criou em nome da religião. Essas tradições foram passadas de geração em geração e foi o que alimentou a fé em tempos tão difíceis: novenas, promessas, romarias, reisados, festas de padroeiro etc. Quando um padre aparecia para dar os sacramentos, encontrava um povo fervoroso, desejoso de Deus. Eu observo isso por onde passo. Nas comunidades onde o povo tem uma religiosidade viva, o padre não encontra muitos obstáculos para evangelizar. Já aquelas onde o povo não sabe cantar uma ladainha, haja suor e lágrimas para pregar o Evangelho. Portanto, quando você encontrar na internet pessoas cantando benditos no altar, ou fazendo suas homenagens de forma diferente da sua, pense duas vezes antes de digitar “sacrilégio”, “abuso”, “profanação”. Você conheceu a fé nos tempos em que os documentos da Igreja são disponibilizados em PDF. Eles conheceram a Deus nos tempos da lamparina e da vela acesa. Mas o que seria então um abuso litúrgico?

É muito fácil identificar. São aqueles atos fabricados de última hora, por leigos e clérigos mal formados. Não têm nada a ver com a história ou a tradição de um povo. São invencionices para tornar a liturgia mais atraente, como dancinhas, carros alegóricos, luzes coloridas e tantas bobagens que não ajudam em nada na evangelização. Ostensórios suspensos no ar, estouro de champanhes, toque de berrantes, enfim. Tentativas de chamar a atenção do público, que acabam por infantilizar os fiéis. Para resumir: devoção é aquilo que um povo cria para louvar a Deus. Profanação é aquilo que alguns inventam para agradar a assembleia.

A prudência é mãe da sabedoria. Por isso, não se deixe levar pela primeira impressão. Observe com cuidado! Aquele vídeo que apareceu na minha linha do tempo é uma coisa antiga e mostra a devoção de um povo? Então, louve a Deus. Se não for, aí é outra história.

 

Padre Gabriel Vila Verde